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Entrevista de Celina Antunes – CEO da Cushman & Wakefield para América do Sul

Publicado em 13 . 10 . 2017


Celina Antunes, muito prazer
Quem é, como gerencia e o que pensa uma das poucas mulheres à frente do mercado imobiliário brasileiro
 
A convidada deste mês é Celina Antunes, CEO para a América do Sul da Cushman & Wakefield, maior empresa de negócios imobiliários da América Latina. A empresa começou em 1994, com apenas quatro funcionários e nenhum cliente, e nossa entrevistada passou a integrar a equipe seis meses depois da abertura da empresa no Brasil. Será que este percurso foi fácil? Certamente que não.
Depois de conhecer melhor a nossa entrevistada e esta trajetória, nos permitimos comparar esta história empresarial a uma cavalgada (seu maior hobby), que é um ótimo esporte para descobrir novos horizontes, culturas diferentes e inacessíveis, ou lugares esplêndidos. Uma “caminhada” que foi realizada não só até as potenciais empresas clientes, mas também nas visitas e estadias à matriz americana.
Para que o mercado descobrisse gratificantes oportunidades de resultados, foi necessário que a executiva superasse vários obstáculos para poder mostrar a importância do negócio de gerenciamento de propriedades executado por uma empresa terceira. Assim, foi imprescindível uma gestão experiente, uma fórmula que permitiu à Celina Antunes conquistar, em conjunto com sua equipe, 13 milhões de metros quadrados sob sua gestão e mais de R$ 26 bilhões em transações imobiliárias.
Neste período, prêmios foram conquistados pela empresa e pela executiva. A pesquisa da Real Estate Awards, da revista Euromoney, por exemplo, elegeu em 2010 a C&W em quatro premiações, como a melhor em: consultoria, empresa de avaliação, pesquisas de mercado e gerenciamento de propriedades. Já a CEO foi eleita em 2008 pelo Wall Street Journal como uma das 50 mulheres mais influentes no mundo dos negócios. Conheça agora a sua trajetória.
 
O que você poderia contar de sua experiência profissional antes da Cushman & Wakefield?
Já desenvolvia trabalhos de arquitetura antes mesmo de me formar Arquiteta. Foi um momento muito bom, mas também de desafios. Como todo brasileiro, passei por todas as crises econômicas, mudanças de moedas. Ao abrir meu primeiro escritório junto com um sócio veio o Plano Sarney (Plano Cruzado), que aqueceu o mercado e acabou por causar uma falta de material de construção no setor. Tivemos então que fechar a empresa – não porque não tínhamos projetos, mas porque não se conseguia construir. Depois abri uma fábrica de mobiliário, que ia bem inclusive exportando para os Estados Unidos, mas aí veio o Plano Collor, que deixou todo mundo com 50 “Cruzeiros” no banco. Naquele momento eu disse a mim mesma que não queria ter mais nenhum negócio próprio, momento em que voltei para a arquitetura e fui trabalhar com o reconhecido arquiteto Arthur Casas. Mais tarde optei por prestar serviços para o próprio Casas e para outros arquitetos. Foi quando me tornei novamente empreendedora, através de minha construtora e gerenciadora de obras. Fiquei neste ramo por quatro anos. Um dos meus clientes era o Ricardo Semler (sócio da Semco, empresa sócia da Cushman & Wakefield a partir de 1994, quando ela se estabeleceu no Brasil). Era a primeira empresa internacional de gerenciamento de propriedades e facilities a entrar no mercado brasileiro.
Como aconteceu o convite para fazer parte da então Cushman & Wakefield Semco? 
O Ricardo Semler veio falar comigo sobre o interesse em abrir a parceria com a Cushman no Brasil e me explicou que os serviços que seriam prestados pela empresa nada mais eram que os serviços que eu já executava em minha própria empresa. Porém, ao invés de gerenciar apenas obras e projetos, a empresa também iria gerenciar operações de facilities e de propriedades. Mesmo sem ter certeza do futuro desta atividade, o poder de persuasão do Ricardo falou mais alto e eu topei o desafio. Aceitei o convite e fui para Nova Iorque por seis meses para aprender o “modus operandi” da C&W. O objetivo era entender, de fato, o escopo do trabalho e o mercado propriamente dito, voltando seis meses depois da abertura efetiva da empresa no Brasil, para assumir o desenvolvimento das operações.
O que este momento representou para você? 
Síntese de tudo: um enorme desafio e o prazer de saber que fomos pioneiros no nosso mercado. Naquela época, por mais que explicássemos aos clientes o que significava a “quarteirização” dos serviços, eles não entendiam a mensagem ou tinham receio das consequências. Foi um desafio muito grande, mas vencemos. Hoje existem outras empresas nacionais e internacionais que focam neste nicho de mercado, inclusive alguns fornecedores que se tornaram nossos concorrentes. Prova de que ajudamos a abrir este mercado. Hoje não é preciso explicar o que é Facility e Property Management. Antes da C&W, tive uma carreira de sucesso e de muito aprendizado, principalmente com os altos e baixos de uma economia fraca e extremamente instável, muito diferente da realidade que estamos vivendo desde o Plano Real.
Como foi passar de arquiteta empreendedora para presidente de uma grande companhia?
Quando abri a fábrica de móveis e depois a construtora, sai da arquitetura e fui para o lado de gestão. Ou seja, eu já tinha entrado no mundo administrativo e principalmente de gestão de terceiros, pois na construção civil é isto que se faz atualmente. A única diferença era que o meu universo eram os segmentos residenciais e o de varejo, enquanto os mercados da C&W eram o segmento de escritórios, o industrial e também o de varejo. O mercado de escritório começou a se desenvolver coincidentemente com a entrada da C&W no Brasil, no início dos anos 90, pois antes disso não existiam os edifícios Classe A (de alto padrão) no mercado. Este novo padrão de qualidade dos edifícios foi também um grande alavancador para a entrada da C&W, pois exigiam um nível de sofisticação na gestão e na operação da infraestrutura instalada. De fato, posso dizer que a minha experiência como arquiteta e como dona de construtora me deu uma boa bagagem para entrar neste segmento.
Os profissionais contratados para esta atividade são geralmente arquitetos e engenheiros. Vocês continuam nesta linha? 
É verdade, a maior parte de nossos colaboradores tem estas especialidades. No entanto, estamos tentando diversificar, pois estas profissões são as mais concorridas neste momento de economia forte em que o mercado de construção civil está extremamente aquecido. É uma questão estratégica para evitar o turnover. Temos atualmente em nosso quadro administradores de empresas, economistas, pessoas de marketing, entre outros. O que importa, de fato, é que as pessoas tenham a capacidade de ler e entender plantas de layout e de instalações, afinal é muito difícil escapar de ter que ler uma planta numa empresa que atua no mercado imobiliário.
Depois da saída da Semco, quando passaram a ser apenas Cushman & Wakefield, o plano estratégico da organização mudou? 
Acredito que já na época em que a Semco buscou a Cushman ela não olhou só o negócio da empresa, mas também o perfil, pois as duas têm características muito similares. Posso dizer que, em termos de gestão, não tivemos nenhuma mudança expressiva na saída da Semco em 2006. A mudança veio de fato depois da crise mundial que se iniciou como uma crise do mercado imobiliário nos EUA e acabou afetando o resto da economia global. Nós, no Brasil, passamos por ela quase que intactos, mas a C&W no resto do mundo sofreu (como todas as outras empresas do mercado) e teve que se transformar para se adaptar à nova realidade.
Qual foi o crescimento de vocês de 2008 para 2009 e em 2010? 
Durante a crise (2008-2009), crescemos 20%. De 2009 para 2010, apesar de termos atingido o nosso recorde em vendas (clientes novos), o resultado foi abaixo dos anos anteriores, pois houveram muitas fusões e aquisições no mercado e algumas delas ocorreram em nossa carteira de clientes. Isto fez com que perdêssemos alguns contratos, o que gerou um resultado em termos de faturamento menor do que o projetado inicialmente, na casa de 9%, menor que a média histórica de 20% da empresa no país.  
O que representou para você ser eleita pelo Wall Street Journal como uma das 50 mulheres mais influentes no mundo dos negócios? 
Para ser sincera, não representou muita coisa. De fato esta reportagem causou furor nos Estados Unidos, muito mais do que aqui no Brasil. Esta matéria é uma coisa bem americana. Eles precisam destacar as principais executivas do mundo e acho que acabei sendo escolhida, pois não havia muitas executivas na minha área de atuação. Acredito, sim, que nós, mulheres, precisamos nos dar valor, mas o fato de eu ser mulher nunca me impediu de fazer ou atuar em nada, assim como nunca me senti preterida por ser mulher. Sei que todas nós mulheres devemos isto à revolução feminina que teve que ocorrer há algumas décadas para que estivéssemos hoje na posição que estamos.
Existe alguma característica pessoal que você transfere para o seu estilo de gestão? 
Sou uma pessoa aberta e contra as estruturas hierárquicas. Da recepcionista a qualquer diretor, todos têm liberdade de se comunicar comigo a qualquer hora. Sempre trabalhei em equipe, gosto de ser assim e trabalho desta forma desde quando eu tinha a construtora. Se eu tivesse que trabalhar numa estrutura super restrita, top down, eu não estaria aqui. Pela primeira vez trabalho em uma sala fechada, pois tenho muitas reuniões por telefone. Mas faço questão de deixar sempre a porta aberta para qualquer um que precise falar comigo.
Qual foi o melhor negócio que realizou na C&W
Foi a venda do prédio do BankBoston, em São Paulo, comprado na época pelo Itaú [agora de propriedade da Hines]. A venda foi importante, pois foi um marco para a virada do mercado de investimentos no país. O valor da transação foi o maior já feito até aquele momento, além de termos representado o Banco Itaú que foi nosso primeiro cliente no Brasil e continua em nossa carteira até hoje. De lá pra cá, já fizemos negócios de maior valor, mas este foi realmente um marco no mercado local e internacional, ainda mais por se tratar de um ícone do mercado, um edifício considerado “Throphy building”.
Quais são os maiores desafios empresariais, considerando ser uma fornecedora de serviços em um país chamado Brasil? 
São tantos desafios…  Até mesmo pela força do mercado, da concorrência, da economia, da legislação brasileira e de outras particularidades que a nossa prestação de serviços tem. A própria permeabilidade da área é um desafio grande. Muitos do mundo corporativo ainda não enxergam Facilities com o potencial que a atividade oferece. Muitos segmentos também resistem em aderir à especialidade da terceirização de uma forma profissional mais completa, o que significa delegar a gestão, e não simplesmente contratar um executor. Antes, quando iniciávamos uma operação, abrangíamos tudo o que não era core business. Hoje, gerenciamos algumas áreas básicas como limpeza, manutenção, recepção, malotes, por exemplo, para ir devagar ampliando o escopo do contrato. Mas isso não ocorre só no Brasil, mas na América do Sul como um todo. É como se ainda faltasse uma identidade para este setor.
O que é mais difícil: competir no Brasil ou mostrar para a sua matriz que este é um País muito particular?
A nossa operação no Brasil é muito importante para a Cushman & Wakefield lá fora. Hoje o Brasil é o carro-chefe da América Latina e o segundo maior mercado para a área de gerenciamento de propriedades fora dos Estados Unidos, que ainda é o maior mercado da empresa mundialmente. A nossa única dificuldade é explicar aos americanos a burocracia e legislação brasileira. Não é fácil para eles entenderem como tudo aqui é tão mais complicado do que lá nos EUA. Como somos auditados pelo menos duas vezes ao ano, e hoje quase tudo esta centralizado nos EUA, levamos muito mais tempo para conseguir aprovar as coisas aqui do que gostaríamos.
Como a C&W tem trabalhado gestão de suas pessoas, capacitação e retenção de talentos? 
Olha, essa é a pior pergunta de todas. Não temos mão de obra qualificada no mercado – isso é realidade. Além disso, os salários estão inflando de tal forma que já estamos ultrapassando salários europeus e americanos. Essa explicação para a matriz também é muito complicada. Estamos coletando até índices da FGV, desde custos de alimentação, transporte, moradia, para explicar que apesar dos salários estarem maiores, o custo de vida no Brasil também está se tornando um dos maiores do mundo. Outra característica do momento é a geração desses profissionais. Temos uma população muito jovem aqui na empresa e o jovem de hoje não fica muito tempo em um lugar. É outro perfil, o qual também precisamos nos adaptar.
Por este fato, corremos o risco de o Brasil não crescer tanto quanto poderia? 
Além da questão conhecida da infraestrutura – portos, rodovias, aeroportos – acho que mão de obra qualificada é outro gargalo para o crescimento do país. Já existem empresas, hoje, abortando projetos de expansão por falta de mão de obra. No caso da C&W, em algumas áreas estamos trazendo pessoas de outros escritórios nossos da América do Sul, como Argentina, além da Holanda e Portugal.
Como anda a concorrência?  
Eu diria que as concorrências locais são as mais complicadas; elas são avassaladoras em alguns casos. Às vezes o processo fica falho porque foram convidados concorrentes que não possuem o mesmo padrão de qualidade. Em outros, o próprio comprador faz um processo errado, do nosso ponto de vista. Portanto, atualmente analisamos bastante os processos nos quais participamos para tentarmos selecionar os que temos chances efetivas de ganhar e onde acreditamos que exista uma vontade do cliente de fazer o processo andar de forma correta.
O mercado corre o risco de ter problemas? 
O pior problema de uma concorrência mal feita, onde se elege uma empresa incapaz de atuar de forma correta/qualitativa, é que este contratante fica tão insatisfeito com o processo que acaba por internalizar todos os serviços novamente, ou seja, vai na contramão do desenvolvimento real do mercado. Eu entendo a força da lei econômica, mas também precisamos colocar na mesa o custo-benefício da gestão e não apenas o custo unitário da equipe de gestão, além da qualidade do serviço e a valorização como um todo que uma empresa como o porte da C&W oferece ao mercado. Nosso capital humano e o próprio tamanho da empresa são nosso diferenciais. A gestão eficiente não é aquela que traz apenas uma redução de custo pontual, mas sim aquela que consegue tornar a operação do cliente mais estratégica e competitiva.
E a qualidade de vida como executiva? Como está? 
Vou confessar que vem melhorando muito. Eu sempre fui uma “workaholic” inveterada, mas depois dos 40 a gente começa a repensar um pouco a vida e priorizar também outras coisas. Sempre trabalhei que nem louca e não me exercitava. Quando minha filha nasceu eu fui morar nos Estados Unidos. Ao voltar para cá, continuei trabalhando muito mais do que devia. Hoje, continuo trabalhando bastante, mas acordo às 6 horas, faço ginástica diariamente e parei de fumar. Estou viajando menos também. Acho que o equilíbrio está mais presente na minha vida.
 
 
Entrevista do portal Revista Infra

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