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Estudo de caso – EcoCommercial Building Brasil

Publicado em 11 . 05 . 2015

Entrevista com Fernando Resende,  Head do programa EcoCommercial Building da Bayer S/A
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O EcoCommercial Building (ECB) Brasil foi o primeiro empreendimento privado brasileiro a obter o LEED-NC Platinum  e poderá também vir a ser o primeiro a gerar energia com sistema fotovoltaico para cobrir 100% de sua necessidade anual. Entre os expressivos resultados, pode-se destacar: a necessidade de sistema de ar condicionado em apenas 5% da área do edifício; uma redução do consumo de água potável de 94,8%; e a preservação de todas as árvores existentes no local.
O projeto também está entre as primeiras experiências de Projeto Integrado no País, que possibilitou uma estreita colaboração entre todos os envolvidos desde o início. Nesta entrevista, Fernando Resende, gerente do Programa EcoCommercial Building no Brasil, relata como foi este processo.
A entrevista feita pelo GBC Brasil teve a colaboração de Francisco Gitahy, professor do curso Projeto Integrado, que acontecerá nos dias 27 e 28 de abril.
 
(1) De quem partiu a iniciativa de adotar um Processo de Projeto Integrado para o empreendimento? Como foram as etapas de projeto e de que forma o processo de projeto foi diferente de processos convencionais?
A iniciativa partiu de uma diretriz global do Programa EcoCommercial Building  da MaterialScience, de que projetos sustentáveis são mais eficientes quando integram todas as partes envolvidas (projetistas, construtor, fornecedores, manutenção usuários, etc.) desde a sua fase de concepção, integrando diferentes pontos de vistas, diferentes necessidades e gerando soluções mais sistêmicas e eficazes, pois os diversos conhecimentos se complementam. Uma vantagem para o projeto do Brasil, foi o conhecimento prévio que a equipe já tinha no desenvolvimento de outros prédios energia zero ao redor do mundo, reconhecendo a real necessidade do projeto integrado.
Incialmente foram definidas as diretrizes de sustentabilidade do projeto,  pelo cliente, como alto índice de eficiência energética (> 50%), usar o clima local em benefício do projeto (luz e ventilação natural, p. ex.), uso extensivo de tecnologias passivas (isolamento térmico, brises, películas refletivas, etc.), certificação LEED mínimo nível Gold,  fontes de energia limpa, aproveitamento de água de chuva, entre outros, e também, não menos importante,  o budget limite do projeto. Elencadas as necessidades, começou-se a estruturar o time de projeto necessário, os consultores, equipe de certificação, equipe de comissionamento, equipe de simulação energética, equipe de custos, equipe de compras, tecnologias construtivas a serem aplicadas e seus fornecedores, equipes de manutenção, segurança e meio ambiente que operarão o edifício, usuários, clientes internos, etc. Elegeu-se também o gerente do projeto, fundamental para “montar o quebra cabeça” e integrar todos os interesses, num fluxo de comunicação viável, determinando os momentos oportunos de participação das partes conforme a temática da discussão. Feito o planejamento inicial,  iniciou-se a implementação  que envolveu diversas reuniões presenciais, à distância e diversas ferramentas de comunicação. Ao longo do processo, conforme o projeto criava vida, o planejamento inicial era revisado, incorporando novas partes ao projeto, conforme a necessidade. As diretrizes iniciais eram verificadas constantemente, para garantir seu atendimento, pois por mais flexível e criativo que um processo de projeto integrado precise ser e possibilitar a participação das diversas partes, o direcionamento deve estar sempre claro. A grande diferença vista é que no que normalmente se enxerga como um decisão apenas do projetista ou do construtor, por exemplo, neste caso, é vista como uma decisão de várias partes, pois o projeto é visto além da fase de construção, envolvendo o usuário, a manutenção, o desempenho esperado ao longo do ciclo de vida, entre outros.
Para citar um exemplo prático de integração,  a escolha dos materiais que comporiam as fachadas e coberturas passaram pela avaliação do arquiteto, pela validação do cliente, pela equipe de simulação energética, que sugeriu alterações para melhorar a eficiência, pela equipe de certificação, que sugeriu formas de aumentar a pontuação no LEED,  pelo fornecedor de automação, que sugeriu soluções que poderiam melhorar o aproveitamento de luz e ventilação natural, pela equipe de manutenção, que avaliou detalhes construtivos e materiais que diminuem a manutenção, pela equipe de segurança, que avaliou aspectos de como garantir maior segurança nas operações de limpeza, pela equipe de custos, que verificava aderência ao budget, entre outros, para então se chegar a um consenso.
 
(2) Como foram as reuniões de equipe multidisciplinares? Em quais etapas de projeto ocorreram e quais agentes participaram?
A partir da determinação de todas as partes que deveriam ser envolvidas, desenvolveu-se um cascateamento dos temas e de quem deveria ser envolvido em cada etapa do projeto. Cada novo agente que era inserido ao grupo sempre era informado sobre as diretrizes macro e andamento atual. Ocorreram diversas reuniões presenciais, divididas por tema, mas também muitas trocas de informação online, conforme o nível de decisão e análise necessários. Isso ajuda a economizar tempo, visto o tamanho da matriz de comunicação e decisões. A presença de um gerente de projetos é fundamental para coordenar o fluxo de comunicação, pois a complexidade aumenta bastante, já que se gera uma matriz bastante ampla e a informação não pode se perder.
 
(3) As metas de desempenho ambiental foram definidas de que forma? Os projetistas e consultores participaram de alguma forma na definição das metas?
As metas seguiram diretrizes globais do Programa EcoCommercial Building, definidas na matriz da MaterialScience. Adaptações das diretrizes às condições locais (clima, cultura, tecnologias construtivas disponíveis etc.) foram feitas pelo head local do programa. A forma de implementação destas diretrizes foi amplamente discutida com projetistas, consultores, fornecedores, que opinaram abertamente sobre diversas possibilidades e soluções etc.. De qualquer forma, sempre houve ampla abertura para que todas as partes opinassem e sugerissem melhorias às diretrizes colocadas. O projeto integrado deve levar em consideração que não existe um participante que conhece tudo, mas sim que o todo é formado pela soma de conhecimentos. A abertura para ouvir e mudar é fundamental.
 
(4) Qual foi o papel das simulações de desempenho energético, para a concepção das soluções, sistemas e materiais? Em que momentos do processo foram conduzidas?
Dada a diretriz de se atingir alta eficiência energética e dado o extenso número de variáveis que o alcance de tal resultado inclui, o papel da simulação energética foi fundamental e atuou do início ao fim do projeto. Diversas decisões foram tomadas como base nas simulações energéticas. A simulação atuou na definição das espessuras de isolamento térmico de PU, no melhor posicionamento dos brises, na definição das faces que necessitavam películas refletivas ou persianas, na escolha do tipo de iluminação de cada área, no posicionamento das abertura para se obter mais ventilação natural, na determinação da influência das árvores existentes incorporadas ao projeto sobre o conforto térmico, no posicionamento das placas de policarbonato para se obter mais luz natural,  na determinação dos cutos no ciclo de vida do edifício com base nas escolhas etc..
 
(5) Quais foram os principais meios empregados para a gestão dos projetos? Foi utilizado um Plano de Qualidade do Empreendimento para o projeto? Foram empregadas ferramentas de TI, como extranet e BIM?
Dado o elevado número de restrições à segurança da informação impostas pela equipe de TI da Bayer, não foi autorizado o uso de sistemas de terceiros, sendo utilizado um sistema próprio para gestão de documentos, que gerou alguma restrição por não ser adaptado a certas necessidades dos projetos de construção. A plataforma BIM não foi utilizada, pois grande parte dos envolvidos ainda não possuía familiaridade com a plataforma.  Por ser um projeto de menor porte, a complexidade foi menor, mas com certeza o BIM pode contribuir muito no projeto integrado, seja no planejamento, nos custos, na própria compatibilização, entre outros.
 
(6) Quais foram os desafios para que a equipe conseguisse não ultrapassar o orçamento previsto inicialmente? Houve algum tipo de otimização contínua de valores (desenvolvimento das soluções de projeto considerando simultaneamente as implicações de desempenho e os custos ao longo do ciclo de vida)?
Sim. O budget do projeto sempre foi uma diretriz “não negociável”, pois, dentro do Programa ECB, acredita-se que o projeto sustentável tem que ser viável economicamente também. Do contrário é apenas um “showroom” de soluções sustentáveis, pouco acessíveis. Por isso, da mesma forma que a simulação energética  direcionou diversas escolhas no projeto, o custo foi um importante direcionador. A planilha de custos foi alterada diversas vezes durante o processo. A cada novo item consensado, seu custo era verificado para ver se se encaixava no budget. Uma das grandes decisões do projeto foi tomada pela associação da simulação energética com o controle contínuo de custos. Em determinada fase do projeto chegou-se a conclusão que o emprego de soluções passivas (isolamento térmico, películas refletivas, ventilação cruzada, luz natural, etc.) poderia gerar as condições de conforto aos usuários, sem a necessidade de uso de ar condicionado. Ao eliminar-se esse sistema (apenas 5% do prédio tem ar condicionado), possibilitou-se uma importante redução de custos e, também significativa  redução do consumo de energia, o que viabilizou, com 60% da verba de climatização, a inserção de placas solares suficientes para alimentar 100% da necessidade do prédio, liberando ainda verba para aplicação em outros itens, como automação ou mais itens passivos.
Outro aspecto de custo bastante considerado, foi o custo de operação gerado e payback das tecnologias empregadas. A escolha das tecnologias construtivas, sistemas de automação, aproveitamento de água de chuva, energia solar, entre outros, foram sempre seguidos da avaliação do custo inicial e da avaliação de redução do custo de operação gerada (ex.: redução de consumo de água e energia). No final chegou-se que o período de payback das tecnologias empregadas para aumentar sua eficiência se dará por volta de 8 anos.
 
(7) Qual foi a importância do Projeto Integrado para os resultados alcançados?
O projeto integrado foi fundamental para se alcançar resultados como a certificação LEED-NC Platinum e o status de primeiro prédio energia zero do Brasil (ainda a ser confirmado, após um ano de operação).  O projeto integrado envolve várias cabeças pensando ao mesmo tempo, no mesmo assunto, no curto, médio e longo prazo. Um prédio, para ser sustentável, deve ser viabilizado na obra em si, mas também nos benefícios gerados durante sua operação (economia de água, energia, redução de custos de manutenção etc.) e, para isso, deve envolver a expertise e o ponto de vistas das diversas partes envolvidas.  O ciclo de vida do prédio deve ser pensado da sua concepção até sua demolição e, por isso, envolve diversas partes. No ECB Brasil por exemplo, diversos itens são modulares para possibilitar a desmontagem e reaproveitamento de partes em outros prédios, no futuro, se um dia for necessário. Isso envolve integrar o arquiteto com diversos fornecedores de materiais e serviços, construtor, equipe de operação etc..
 
(8) Quais foram as principais dificuldades e pontos positivos vivenciados e, na sua opinião, qual foi a percepção dos agentes em relação ao processo?
Os pontos positivos tem sido todos os resultados e reconhecimentos que o prédio tem recebido, se tornando uma referência para diversos projetos de construção sustentável. O ECB Brasil recebeu mais de 1000 visitantes, que voluntariamente solicitaram para visitar o prédio desde junho de 2014, quando foi inaugurado.
Um projeto deste tipo acaba necessitando de uma equipe maior de profissionais e especialistas, seja para o gerenciamento, para o projeto ou para a implementação. Mas o que em princípio parece uma dificuldade, acaba se pagando, pois o prédio é executado de forma mais rápida, dentro do custo previsto e sem modificações durante sua construção. Isso por que as partes envolvidas participam ativamente das decisões, alcançando  resultados mais eficazes, devido a uma soma de conhecimentos de pessoas que dominam diferentes partes do ciclo de vida do edifício.
A percepção dos agentes foi sempre positiva, pois desde o início, apesar da maior complexidade, havia uma meta muito clara, que era criar um prédio de referência no Brasil.

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